o poema mais longo da minha vida

Gabi Blenda
2 min readFeb 23, 2023

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lambe o asfalto
pisa no inferno
para assistir
a delicadeza de quem voa
de quem dissolve na menor quentura de toque
de quem usa hálito morno para esfriar com sopro
o que pesa e excita
dança entre os pratos da balança
riso pinga do glóbulo ocular
gota salga os lábios
passaria horas te ouvindo falar
esqueceria de mim
de minha própria narrativa
e eu não posso arriscar
copiar o passado no futuro
eu tenho medo de me perder na estrada
depois de encontrar o caminho-destino
o mapa que carrego em meu ventre
entranhas
estranhas
vísceras
que me devoram Vida
eu nunca mais poderia…
parece uma equação infinita
errar novamente a mesma alternativa
e continuar a

errar

errar

errar

a alternativa

é uma lição mal sucedida

é uma missão fracassada

tentar vencer este jogo

era apenas diversão

diversão

diversão

consumição

consumação

fim

fim

fim

novamente

repete

a escolha

das alternativas

error 402

eu fui banida

de uma espécie de paraíso

que nem sabia que existia

de um território de inquietação

expulsa

banida

forasteira

um portão sem divisa

fronteira

fronteiriça

subalterna

subordinação

fui expulsa ou me expulsei

outra gente não fala o idioma

língua estrangeira

sem proficiência

que língua é essa

nem mátria

nem pátria

nem fratria

nem erótica

que língua é essa

que ilógica é essa

que discurso é esse

localizado

somatizado

em órgãos

concavidades

pele

pelos

avessos

nulidades

desconhecidas

descobrir os vazios de si mesme

descobrir os silêncios brutais da própria fala

descobrir a visão da cegueira

o som da surdez

que maldita língua eu (não) falo agora

eu discorro agora

que mal dita língua

ouvinte algum

entendedor nenhum

fala agora

eu era a única nativa deste território

terreno

baldio

vazio

amaldiçoado

a única forasteira desse idioma

eu era a única expatriada

a única deserdada

a única expulsa

a única expurgada

eu era a única a maldizer

a bendizer

eu era a única a saber

dos calafrios

dos medos visguentos em minhas entranhas

a única a provar o sabor da fruta

a única a beber no cálice

a única a provar o fruto proibido

a única a lamber os dedos

eu era a única

no território maldito bendito

a única

a única

a única

e nunca mais voltarei a ser a única

nunca temi fantasmas

nunca temi cadáveres

nunca temi mortos vivos

nunca temi zumbis

nunca temi natimortos

nunca temi embriões extirpados

nunca temi mutilados

nunca temi o sangue

nunca temi o desprezo

só temia o amor

só temi a vc.

só temi o temer

só temi o pavor

só temi o odor fétido de afeto

estranhando entranhas

podia suporte o embrutecido

mas nunca a própria delicadeza

poderia suportar o cancro

nunca o cuidado

nunca o afeto

alérgica

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Gabi Blenda
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