lágrimas ao sol
se meu olho fosse boca
se minha visão tivesse voz
se a pedra derretesse
se a defesa desmoronasse
se meu lábio cantasse
o som e a palavra
que guardo em meu peito
a resposta
pro que me perguntas
o que aconteceu hoje
é a raiva
e o medo
que me assusta
estar vulnerável
tocar o amor em meu peito
eu odeio
o amor não ser considerado força
porque
se for fraqueza
eu fico frágil
o tempo todo
se for armadilha humana
esses sentimentos
eu queria que fotografasse
a dureza
de um coração
congelado
a frieza
de uma alma
despedaçada
eu conjuraria flores
faria do mel a única bíblia
do pólen a única oração
tudo isso
pra disfarçar
os ventos
que insistem
em alardear os sinos
os embalos
dos quadris
nus
abraços
eu não queria
que esta areia
que me tornei
voltasse
a beijar marés
para enfrentar
outra tempestade desértica
isso tudo
pra falar
que te amo
que tem amor aqui pra você
mesmo que decida fugir correndo
fugindo
ou ficando
tem amor
aqui
pra você
é que não quis confessar isso antes
não quis admitir
para mim mesma
que talvez eu já te amasse antes
quando te ouvi pela primeira vez
o som da tua voz
com os teus gestos combinando
e eu quis proteger as defesas
as portas
as grades
e os cadeados
eu quis me proteger
me manter
inteira
porque não posso
me dar ao luxo
de despedaçar
outra vez
de dissolver ao toque morno
outra vez
de embalar canções
outra vez
de me machucar
outra vez
de mudar de cidade
outra vez
de encarar a solidão
outra vez
de não ter o toque
outra vez
amar
é habitar uma praia deserta
com montes de pedra
areia
salitro
som de mar
pele seca
garganta sedenta
e receber visitas
esporádicas
pra te acompanhar
no vazio
entre por do sois
ninho