Há quem diga que eu não sou de nada
Eu vi um homem vestido da cor do tijolo
Meu cóccix dói de tanto tempo sentada
Cansaço existencial, somado à noite mal dormida
Mal comida
Só lembrei que era dia da mulher quando vi alguém carregando flores
Mrs Dalloway disse que iria comprar flores ela mesma
Miley Cyrus canta em meu ouvido
Eu tô cansada
E não consigo descanso
A consciência é uma luz que se acende aos poucos
A materialidade de minhas palavras já ocupa tanto espaço que agora pago por armazenamento
Não é gratuito
É caro existir até virtualmente
Para por um local onde caiba a mim, minhas fotos, minhas dores, minha materialidade que ficará mesmo quando eu for embora
Vejo uma foto no instagram
E me pergunto como faz para ser como essas outras artistas
Que não parecem viver em ciclos e gangorras como eu vivo
Uma opinião sobre mim não significa que é verdade
Eu nem sou de verdade
Me disfarço e refaço todas as noites
Todos os dias
As células do meu corpo já foram substituídas
Já não é o mesmo de seis meses atrás
Já não é o mesmo de vinte e nove anos atrás
Quando eu nascia
Eu não sabia que iria acontecer isso tudo
Esse grande nada que me acontece todos os dias
E continuo inventando coisas grandes para fazer
Mesmo eu sendo uma formiga
Insisto em carregar folhas mais pesadas que minhas costelas, que já pesam tonelada demais pra um corpo alérgico como o meu andar por aí, à esmo, sem salva-vidas, guarda-costas, corpo de bombeiro, patrulha canina, alguém chama a Priscila.