Eu tenho muito para falar e sempre digo tão pouco

Gabi Blenda
2 min readOct 4, 2020

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Photo by Ehimetalor Akhere Unuabona on Unsplash

Deitada na cama, o olho abre. O coração acelera. O celular está na prateleira oposta à cama, modo avião ativado. Vira de lado e se cobre novamente. Pode ter mensagem. Se algo ficou errado? Tenho que revisar a planilha, mudar todos os prazo novamente. Já devem ter mandado nova pauta. Vira para o lado onde estava antes. Abraça o travesseiro. Peito sufocado. Para onde foi todo o ar que estava aqui? Engole seco. Calor. Se descobre. Pega o relógio de pulso na cabeceira. 2:25 da manhã. Volta a dormir, por favor. Estômago ronca. Passou o dia com um mingau de aveia que tomou de manhã. Uma caneca de suco antes de ir para cama. Fome. Cansaço. Sono. Peito aperta de novo. Puxa o ar com força. Vontade de chorar. Zero lágrimas. Zero é o número de responsabilidades que desejaria lidar. Consegue dormir. Acorda com o gato miando. Que horas são? Ainda está escuro lá fora. Pode ter mensagem no celular. Levanta. Desativa o modo avião. Mensagem no grupo do Whatsapp. O nome em azul com um @ na frente. Uma marcação. Duas marcações. Três marcações. “Liguei e seu celular está dando fora de área”, anunciam no grupo. O coração aperta. Põe o óculos. Envia um ok como forma de dizer “Visualizei, estou fazendo”. Tenta se agarrar às palavras da psicóloga: pode haver um tempo entre sua resposta e a demanda do outro. Psicanálise, sua linda. Faz tudo o que pediram. Os gatilhos todos de volta. Envia para o amigo “Preciso mudar de profissão”. Recebe um “Vai ser professora?”. “Antes isso do que me ocupar com métrica de rede social”, responde. “Ninguém espera que você responda entre 21h e 7h”, dizem. Mensagem no grupo meia noite. Outra mensagem seis da manhã. Mensagem agora, enquanto escreve o texto. O fim do mundo ali na esquina, mas e os resultados, já entregou?

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Gabi Blenda
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