Corrente elétrica de alta tensão
Eu escorria poema de amor, sem saber
Que minha vó morria no chão da sala
No apartamento ao lado do meu
Passei pela rua e vi o Samu, sem saber
Que era para ela
Tudo pareceu banal-brutal
O ciúmes
O medo
De não ser tão divertida assim
Tão gostosa assim
Tão criativa-profana assim
Manter o foco no que importa
O olho na bola
A intenção na cena
Manter em vista
O objetivo do jogo
Por que entramos no quarto
Estamos na cama
Amanhã é aniversário de seu avô, lembrou minha mãe
E se minha avó morrer no mesmo dia em que ele nasceu?
Porque a vida não perdoa uma ironia
Aproveita todas as chances mórbidas de ser poética
Em vez de realizar o sonho de ser juíza, mamãe
Fálica, afundada na patriarcal hegemonia
Se tornou dona de casa, em vez de mulher
Legislando e condenando a minha vida
Se tornou, o meu existir
Um tribunal arbitrário de julgamentos cruéis
Diferente dos outros, os seus sentidos não estão embaçados
Você olha e enxerga, ouve e escuta, toca com assinatura
Repara em mim
De um jeito que ninguém mais vê
Descobre os códigos que abrem o cofre
Do meu cérebro e cintura
Imagens exclusivas do meu glóbulo ocular
Você dançando Força Estranha, na versão de Igor Kannário
Você cantando Meu Nome é Gal
Você palitando o dente após almoço
Você urrando de tesão e prazer
Se isto aqui der muito ruim
Será fatal
Usarmos nossas proezas artísticas
Para falar mal
Um do outro
As pessoas podem pensar
Que é por motivo sexual
Interesse profissional
Pacto com o demônio
Inocência angelical
Mas o motivo real é que
Tua lúcida loucura
Me faz gritar eureka
A cada banho
Tal qual Arquimedes
Psiu, eu já sei a resposta
Quero estar com você
Por motivos puramente egoístas
Nas últimas décadas
Encontrei nada remotamente semelhante
Ao que você me oferta
Sejamos clichês
Cafonas
Bregas
Vulgares
Imorais
Ilegais
Mas nunca caretas, por favor
Cabe a mim aceitar
A transitoriedade de esteira rolante
Ainda que o temor me assombre e surte
De ser mais uma caixa com a etiqueta ex
Eu tenho medo da data de expiração
Da validade vencida
Mas o único antídoto contra a morte
É a vida
Que não é perfeita, amor
Se eu tiver algum dinheiro pra nossa gasolina
Já está bom
Meu bezerro desmamado
Carneiro desgarrado
Anjo decaído
Que disfarça com alfazema
O cheiro de enxofre
Que disfarça com calhordice
O coração fraco e torto
Nunca tive permissão
Para fazer o que quero
Beber, fumar, trepar, gozar
Cresci obediente às regras
Ordens
Leis
Protocolos
Autoridades
Enquanto internamente
Desejava a subversão
Oxalá eu me torne a monstra
Que vai devorar você
Fisiológica
&
Esteticamente
Uma mulher sem limites é uma coisa perigosamente
Linda
De se ver
Tal qual o sol
Que torra a pele
Tosta a córnea
Desidrata no deserto
Frita o cérebro no sertão
Não olhe diretamente
A menos que queira
Arder em chamas
Eu preciso
Do teu amor e liberdade
Por fração de tempo cósmico
Porção de espaço galáctico
Eu preciso
Do teu amor e liberdade
Por um breve segundo
Em que gozas
Dentro/fora
Dentro/fora
Dentro/fora
Por cima/embaixo
Por cima/embaixo
Por cima/embaixo
Aqui/ali
Aqui/ali
Aqui/ali
Eu preciso
Do teu amor e liberdade
Por alguns instantes
Você tem pressa?
A nossa sorte
É meter suave e lento
Não disse quem era o animal silvestre
Mas somos espelhos, lembra?
De olhar narcísico
Disparando raio
Em terra umedecida
Eu
P.S.: Eu vou desdizer aquilo tudo que eu lhe disse antes, porque já é noite, e a passagem de tempo me mostrou outro ângulo. Mas estou cansada para escrever um novo poema.